GIOVANNI G. CERRI
O início de um ano carrega um conteúdo simbólico inegável. Representa ciclos que se renovam, a volta ao começo e a possibilidade de tentar de novo. Fenômeno astronômico sem nada de mais interessante (só em nosso sistema solar, outros sete planetas têm, cada um, o seu “ano”). Mas o ser humano é movido por símbolos – e ciclos que se renovam estão entre os mais poderosos. O setor de saúde no Brasil se encontra em um ciclo de renovação pela digitalização – acelerada com a chegada da velocidade 5G de conexão à internet –, e o início de mais um ano (na Terra) é ocasião ideal para se lembrar alguns pontos importantes desse percurso.
O HCFMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP), para começar, fechou em 2022 uma parceria com nomes de enorme força para testar o 5G na saúde. Assim, governo, universidade e instituições financeiras criarão no país um ecossistema para rede privada em Open RAN (Rede de Acesso de Rádio Aberto, na sigla em inglês). Concluída, essa iniciativa colocará o Brasil no bastante seleto grupo de países que dispõe desse uso da tecnologia na área de saúde. O projeto OpenCare 5G é uma iniciativa do InRad (Instituto de Radiologia), do HCFMUSP, e com isso o projeto piloto vai usar exames de imagem – ultrassom, pré-laudos de tomografia e raios-x de tórax, ressonância magnética de próstata e de crânio, e radioterapia.
Os parceiros envolvidos dão a dimensão da escala que se projeta para o projeto: Itaú Unibanco; Siemens Healthineers; NEC; Telecom Infra Project; ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial); BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e Escola Politécnica da USP.
O ganho que o Brasil teria se o trabalho entre essas três frentes – governos, academia e setor privado – fosse incentivado e se tornasse mais frequente, como o é em tantos lugares no mundo, teria potencial para transformar o cenário da saúde no país. Estamos no início de um novo ciclo, inclusive político. Quem sabe, não se poderia abrir o ano com discussões que se aprofundem nessa ideia.
A velocidade 5G amplia a capacidade de transmissão de dados em relação à velocidade anterior (4G) na ordem de quase cem vezes. Isso significa, em termos práticos, um serviço de muito maior qualidade nos processos na área da saúde. E a rede Open RAN é uma tecnologia aberta que permite essa aceleração toda a custos mais baixos que o aplicado tradicionalmente pela indústria de telecomunicações. A covid-19 mostrou que saúde e tecnologia têm que ser cada vez mais integradas. Com a rede 5G, a telemedicina e, de forma mais ampla, a telessaúde chegarão mais longe no Brasil, ampliando o acesso à medicina. Não há como ressaltar o suficiente a importância de um avanço desse tipo.
E porque a inovação é a razão de ser desse avanço da digitalização na saúde, o InovaHC (Núcleo de Inovação Tecnológica do HC) – projeto que busca tornar processos na saúde mais eficientes e de custos menores – também trabalha em um projeto que envolve a iniciativa privada do setor de telecomunicações (com Claro e Embratel) para levar o 5G à sala de cirurgia do Icesp (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo).
Essas iniciativas tanto mostram que se busca fazer com que a tecnologia esteja cada vez mais ao alcance do serviço público de saúde como servem para indicar o que ainda há por fazer. O SUS (Sistema Único de Saúde), com tudo em que precisa ser aperfeiçoado, é uma referência global. É o maior do mundo, para países com características comparáveis às do Brasil. Uma tecnologia de comunicação que possibilite a cada brasileiro poder falar com um médico, é um avanço civilizatório imenso. Nenhuma das desigualdades que marcam hoje o Brasil é justificável, e menos ainda aceitável; mas na saúde, elas são particularmente cruéis, como a pandemia bem mostrou.
Que a nova volta em torno do Sol que acaba de começar, e com o novo ciclo político que também tem início agora, a saúde esteja ao alcance de todos os brasileiros. E com a tecnologia digital, ela chegará a eles, mais rápido, com menor custo, e com qualidade crescente.
Leia a Coluna Diagnósticos por Imagem em nossa Revista Digital clicando aqui