Tecnologias de imagem, como PET, e em exames de sangue, avançam a cada dia – e precisam chegar à saúde pública
GIOVANNI G. CERRI
Informação é o recurso mais estratégico de que se pode dispor. Essa afirmação pode soar um tanto redundante, já que vivemos justamente no que se convencionou chamar de “Era da Informação”. Mas exatamente por isso é oportuno que, de tempos em tempos, isso seja lembrado, principalmente no campo da saúde. E neste, o eixo central é dispor da informação o mais cedo possível – o que leva a cada vez mais, avanços tecnológicos para se chegar ao diagnóstico precoce.
Um exemplo de grande desafio a obtenção do diagnóstico precoce, e do papel relevante do avanço da tecnologia nisso, é o mal de Alzheimer – doença que, no Brasil, atinge ou pode vir a atingir mais de 1,2 milhão de pessoas, de acordo com dados do Ministério da Saúde. O Alzheimer é uma doença de difícil diagnóstico, para o qual não existe fórmula simples, e é aí que o avanço científico e tecnológico mostra sua importância. Em maio, um estudo de pesquisadores da Universidade da Califórnia detectou com um exame de sangue a enzima PHGDH – que, se encontrada em níveis elevados, sinaliza um risco elevado para Alzheimer.
O Brasil apresentou um avanço importante na detecção precoce de Alzheimer em 2019, com o método desenvolvido por pesquisadores da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas): a análise da morfologia (do formato) do cérebro, com o uso de imagens 3D geradas por ressonância magnética, permite apontar se a doença de Alzheimer já está em curso ou se há indicações de que possa vir a se desenvolver. Isso leva mais rapidez e precisão ao diagnóstico – e em se tratando de Alzheimer, saber o quanto antes é fundamental.
O uso de exames de imagem, como o PET (tomografia por emissão de pósitrons, na sigla em inglês), é outra ferramenta de grande valor na medicina diagnóstica. Segundo a plataforma especializada Medscape, essa ferramenta fez com que mais de 60% dos médicos que a usaram para detectar placas amiloides no cérebro dos pacientes mudaram o tratamento (tais placas são sinal fundamental da doença de Alzheimer).
A expectativa, diz o Medscape, era de que isso seria o caso em apenas 30% dos tratamentos. Isso acontece porque o uso de PET torna os resultados muito mais precisos. Um dos médicos ouvidos pela plataforma ressalta que, antes do exame, mais de 70% dos pacientes que o realizaram tinham um diagnóstico de Alzheimer como o mais provável. Mais uma vez, o conhecimento precoce das condições dos pacientes permitiu adotar estratégias mais eficazes e mais precisas.
Eficiência e rapidez são possíveis porque, como pilar das novas tecnologias aplicadas à saúde está a IA (inteligência artificial). O aprendizado de máquina está na ponta dos avanços da tecnologia da informação, e já é possível, por exemplo, avaliar pacientes com suspeita de Alzheimer através da fala – não só por meio de fatores como a velocidade da fala do paciente, mas mesmo através do conteúdo de conversas com pessoas em conversas telefônicas. Essa avaliação cognitiva foi feita em 2020 no Japão, com um software de IA, num intervalo de dois meses de ligações para pessoas a partir de 65 anos de idade.
O emprego das tecnologias de ponta em diagnósticos é a aplicabilidade nos serviços públicos de saúde. Trata-se de um desafio nada trivial, uma vez que os custos envolvidos são consideráveis, mas também de preparo técnico e investimentos em infraestrutura. Em 2020, o American College of Radiology e a Alzheimer’s Association lançaram nos EUA um programa de uso de PET para tratar pacientes com distúrbios de memória – e a iniciativa teve foco em participantes afro-americanos e latinos beneficiários dos sistemas Medicare e Medicaid (que são os planos de saúde públicos dos EUA). Os custos envolvidos seriam reembolsados pelos dois sistemas. No Brasil, embora o projeto Cíclotron, do InRad (Instituto de Radiologia do Hospital das Clínicas) tenha viabilizado a realização de PET em pacientes do SUS (Sistema Único de Saúde), esse tipo de exame não é oferecido na rede pública.
É preciso fazer com que todos os brasileiros tenham acesso ao que há em mais moderno em diagnóstico – e não só quanto à doença de Alzheimer, mas de qualquer outra condição de saúde, como diabetes, câncer, cardiopatias, para citar apenas algumas –, até porque o investimento na prevenção tem potencial de poupar gastos com tratamento. No campo da saúde, a tecnologia avança para que a prevenção se torne a linha mestra no atendimento às pessoas. Afinal, como há muito a sabedoria popular já sabe: é melhor prevenir do que remediar.
*Giovanni Guido Cerri*, médico, é presidente do Conselho do Instituto de Radiologia e presidente do Conselho de Inovação (InovaHC) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Foi diretor da FMUSP, diretor-geral do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp) e secretário de Estado da Saúde de São Paulo
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