José de Souza Andrade-Filho*
Volvo refere-se à oclusão produzida pela torção de um órgão em torno de seu eixo, ocorrendo em vísceras móveis. Ao nível do intestino, é causado em geral pela existência de uma aderência ou brida pós-operatória. No estômago está associado a uma hérnia pelo hiato esofágico. Antes da oclusão, o volvo pode acompanhar-se de distúrbio circulatório isquêmico grave ou de necrose.
Pode acontecer volvo no ceco, na vesícula biliar e no estômago, além de várias outras regiões do intestino grosso e do intestino delgado. A maioria dos casos de volvo do intestino grosso ocorre no sigmoide devido a sua maior motilidade. Em alguns países incide, de preferência, em homens de meia idade, mas, em outros, são as pessoas idosas, de ambos os sexos, com velhos hábitos de evacuação alterados, as mais expostas. No caso de volvo, o processo patológico de torção do órgão sob o seu próprio eixo, corresponde a um verdadeiro nó nas tripas (Fig.1) (Prof. Luis Rey – Dicionário de Medicina e Saúde). Contudo, no conceito popular, pode referir-se a outras doenças, como a apendicite aguda em tempos passados. As complicações, sem tratamento, podem ser graves, gerando isquemia e anóxia do segmento comprometido, incluindo possível perfuração intestinal e peritonite.
A nomenclatura médica ora se refere a vólvulo, ora a volvo, gerando certa polêmica. Procuramos a fonte para dirimir a dúvida: o professor Jofre Marcondes de Rezende. Em um dos seus bons livros, Linguagem Médica, ensina: uma das afecções comuns em patologia do Sistema Digestório é a torção de uma víscera oca em torno de sua fixação na parede abdominal, denominada vólvulo ou volvo. Pode ocorrer em qualquer segmento do tubo digestivo, como estômago, intestino delgado, ceco, cólon, porém é mais comum no cólon sigmoide, por sua extensão e livre mobilidade na cavidade abdominal, sobretudo nos casos em que o mesmo se apresenta alongado ou dilatado. Em terminologia médica deve usar-se um único nome para cada coisa e sinonímia deve ser evitada. Assim sempre que deparamos com mais de um termo com o mesmo significado, devemos optar por um deles. Em nosso idioma há uma clara preferência pela forma volvo, que certamente irá substituir em definitivo a forma vólvulo. Ambos os termos são variantes de uma mesma palavra latina, volvulus, por sua vez derivada do verbo volvo, volvere, com o sentido de enrolar, rodar. Do latim, o termo passou para as línguas modernas, conservando a grafia original em francês, inglês e alemão, sofrendo adaptações em outros idiomas.
Alguns comentários de leigos: “Nó nas tripas é quando o intestino se enrola e dá um nó. Eu quase tive isso, minha sorte é que fui ao médico antes, do contrário teria morrido. Só não me pergunte como isso acontece”; “ O nosso intestino não é fixo, e se movimenta quando nos movimentamos também. Caso ele amarre e dê um nó, é preciso fazer cirurgia: abrir o abdome e desfazer o nó”.
A língua portuguesa é rica em seus meandros. A palavra volvo de origem latina, como vimos acima, pode ser torção de uma víscera, também um veículo da marca Volvo ou o verbo apaixonado do grande poeta mineiro Alphonsus de Guimaraens: volvo o rosto para o teu afago, vendo o consolo dos teus olhares (Obra Completa).
*José de Souza Andrade-Filho – Patologista no Hospital Felício Rocho-BH; membro da Academia Mineira de Medicina e Professor de Patologia da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais.