Por Paula Menezes*
É curioso ver como alguns temas, de repente, são cunhados e viram cool. O patient-centricity é a mais “nova” discussão e foco das indústrias farmacêuticas. Para quem é do terceiro setor, como eu, algumas vezes fica difícil entender por que o foco no paciente está sendo incorporado à cultura da indústria farmacêutica somente agora. Onde estava o paciente até o momento, senão no centro?
É claro que essa mudança de paradigmas vem acompanhada de uma possibilidade de crescimento de resultado a longo prazo. Mas eu, particularmente, não me preocupo com as motivações que levam às pessoas a darem voz ao paciente. O meu objetivo é ter o paciente no centro da cadeia, não importando por que cada um o colocou lá.
Todavia, toda mudança de paradigmas é difícil. O questionamento que faço é: como, num passe de mágica, uma indústria focada em vendas e market share passará a focar no paciente? Quão profunda deverá ser essa mudança? A soberba da indústria (usual, muitas vezes), confiante de que irá fazê-lo de forma natural é chocante. Vejo alguns gerentes e diretores completamente convictos de que são capazes e que já estão fazendo grandes mudanças internas. Não é bem assim.
O inbound da indústria e das organizações de pacientes é o mesmo: dinheiro. Ambas precisam de recursos para crescer e se desenvolver. A principal diferença está no outbound: enquanto a indústria também quer fazer dinheiro através de vendas, a organização de pacientes busca melhorar a qualidade de vida dos pacientes.
Isso acontece porque o terceiro setor é bonzinho e as indústrias farmacêuticas são insensíveis? Não. Acontece porque, simplesmente, temos DNA diferente. Foi assim que nascemos e construímos nossa história.
E como mudar isso? Ao menos que haja uma mutação, a indústria farmacêutica nunca terá o foco no paciente. Para isso, ainda que se preserve o outbound final sendo lucro, este somente será alcançado a longo prazo. Será a consequência de mudança agora, com novas métricas de bonificação a curto prazo, similares a das organizações: melhora da qualidade de vida, aumento de diagnósticos e etc. Além disso, é fundamental que a indústria passe a buscar recursos humanos que possuem background no terceiro setor. Somente essas pessoas reforçarão, a cada dia, o foco no paciente.
Enquanto a indústria focar em uma mudança a longo prazo, bonificando os colaboradores através de métricas curtas, baseadas em vendas, o paciente nunca estará no centro. Enquanto a indústria buscar profissionais “puro sangue farmacêutico” para contratação, o foco no paciente será apenas uma campanha política, e será usado como aquele pretinho básico, que sempre arrasa.
*Paula Menezes é advogada, empresária, presidente da (Associação Brasileira de Apoio à Família com Hipertensão Pulmonar e Doenças Correlatas – ABRAF) e vice-presidente da Sociedade Latina de Hipertensão Pulmonar (SLHP).