A educação contemporânea enfrenta desafios complexos que exigem uma reflexão crítica sobre suas finalidades e métodos. Este artigo busca analisar as contribuições filosóficas de Michel Foucault e Viktor Frankl para repensar os dilemas educacionais atuais, enfatizando a importância do “cuidado de si” e da “busca por sentido” no processo formativo.
Michel Foucault, em sua análise da “Sociedade Disciplinar” (séculos XVII e XVIII), descreve a escola como uma instituição que exerce controle minucioso sobre os indivíduos, visando torná-los dóceis e úteis para a sociedade. Nesse contexto, a disciplina padroniza os sujeitos por meio da organização do espaço e do tempo, hierarquizações e classificações, transformando-os em objetos de manipulação. Contudo, Foucault também reconhece a capacidade de resistência dos sujeitos, que podem modificar as relações de poder e se transformar. Em sua obra tardia “A Hermenêutica do Sujeito”, o filósofo aprofunda o conceito de “cuidado de si” como um caminho para a emancipação e a constituição de formas de existência que desafiam a dominação. O “cuidado de si” não se restringe a um ato egoísta, mas implica um esforço ético e político de autoconhecimento e de reflexão sobre os valores que norteiam a vida.
Paralelamente, Viktor Frankl, fundador da Logoterapia e Análise Existencial, oferece uma perspectiva antropológica centrada na liberdade, responsabilidade e busca por sentido. A Logoterapia se fundamenta em três pilares: a liberdade da vontade (a capacidade humana de tomar uma posição diante dos condicionamentos), a vontade de sentido (a dinâmica motivacional inerente ao ser humano para encontrar e realizar propósitos) e o sentido da vida (que transcende o significado subjetivo e pode ser apreendido através de valores, compreensão de si e do mundo, projetos de vida e enfrentamento de adversidades). Para Frankl, a responsabilidade e a consciência são fenômenos próprios do ser humano, emanando do “inconsciente espiritual”. A educação, sob a ótica da Logoterapia, deve ser voltada para a realização de valores e a busca de sentido, capacitando o indivíduo a assumir sua missão na vida e a transformar a existência em algo carregado de significado.
A convergência entre Foucault e Frankl reside na visão de uma educação mais dialógica e centrada no ser humano. Ambos os pensadores propõem uma redefinição do papel do educador, que transcende a mera transmissão de conhecimentos para se tornar um facilitador na descoberta de sentido e responsabilidade por parte dos estudantes. A maiêutica socrática, resgatada por Daniele Bruzzone, exemplifica essa abordagem, promovendo a inquietação intelectual, o autoconhecimento e a autonomia por meio do diálogo e da interrogação constante. A educação não deve se limitar à satisfação de necessidades ou à autoexpressão simplista, mas sim fomentar uma busca ativa por objetivos significativos, gerando uma tensão construtiva que mobilize o ser humano para a realização de tarefas relevantes e o desenvolvimento da tolerância à frustração. Nesse sentido, o educador atua como um “catalisador da vontade de sentido” dos educandos, apresentando o mundo objetivo de forma a fazer resplandecer os sentidos a serem colhidos em cada situação de vivência e aprendizagem.
Em síntese, o repensar da escola como um espaço de criação coletiva e ressignificação, que transcenda a lógica produtivista e tecnicista, é fundamental para uma educação que promova a responsabilidade, auxilie na descoberta do projeto existencial e conduza à realização de valores e ao encontro de sentido. Incorporar a concepção do “cuidado do sentido”, proposta pela Logoterapia, amplia a ética do cuidado de Foucault, direcionando a educação para uma formação integral do indivíduo, que se reconhece como um ser aberto e capaz de atualizar seu potencial.
Referência:
FERREIRA, F. N. Cuidado de si e sentido da vida: um ensaio sobre os desafios da educação. Open Minds International Journal, São Paulo, v. 6, n. 1, p. 227-235, jan./abr. 2025.
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