Autores: Caroline Neves e Anderson Pereira Soares
Introdução
O vírus da dengue (DENV) é um dos mais importantes e estudados arbovírus. Foi a segunda arbovirose a se ter conhecimento e a muito se tem relatos sobre suas injurias, principalmente nos continentes africano e asiático, porém os primeiros registros reconhecidos como oficiais são datados do século XVIII, nas Américas (1,2).
Apesar de ser originário da África, o primeiro genótipo a ser isolado aconteceu em 1943, com o vírus que circulava no Japão, o primeiro vírus da dengue (DENV-1). No ano de 1945, uma enfermidade com sintomas similares circulava no Havaí, e então um novo sorotipo foi isolado (DENV-2) e observou-se que a resposta imunológica pelo organismo era diferente quando comparado ao tipo DENV-1. Na década seguinte também foram isolados o vírus nas Filipinas (DENV-3) e na Tailândia (DENV-4) (3,4). Atualmente, a distribuição geográfica se concentra na faixa tropical tanto ao norte quanto ao sul do planeta (3,5,6).
A tentativa de controlar e detectar precocemente esta infecção são um problema global de saúde pública no momento, uma vez que não há um tratamento específico, além da possível evolução para quadros mais graves, como a febre hemorrágica da dengue (FHD) (2,5,7). O diagnóstico errôneo contribui para sua subnotificação, sendo estimada a proporção de uma notificação a cada vinte casos (8). A Organização Mundial da Saúde calcula que, anualmente, surjam 390 milhões de novas infecções(9).
Devido à importância clínica de sua detecção, o foco principal deste trabalho está em utilizar abordagens computacionais in silico para evidenciar possíveis novos focos de estudo na estrutura do vírus. Esse tipo de análise pode colaborar para o desenvolvimento novos métodos e estratégias diagnósticas e preventivas (2,10,11).
O vírus é constituído por um envelope de forma esférica e um capsídeo de simetria icosaédrica, possui tamanho aproximado de 50 nm e seu material genético é composto por RNA de cadeia simples em sentido positivo (ssRNA+), com cerca de 10,7kb (3,10).
Acredita-se que as células dendríticas sejam as primeiras a se infectar, através da adsorção da proteína envelope (E) ao receptor de membrana (DC-SIGN) (3,4). O vírus adentra a célula por endocitose, onde o ambiente ácido do endossomo (pH 5,7) propicia uma mudança conformacional na estrutura da proteína E, causando a fusão pH mediada. O rompimento do capsídeo viral libera seu RNA no citoplasma, que é traduzido em uma poliproteína. Esta será clivada por enzimas citoplasmáticas, produzindo três proteínas estruturais (C, prM/M, E) e sete proteínas não estruturais (NS1, NS2A, NS2B, NS3, NS4A, NS4B, NS5) (4,12).
A replicação do RNA viral acontece em simultâneo a produção de proteínas. A leitura da fita é feita por uma ORF (Open Reading Frame), delimitada por uma região não traduzida nas extremidades 5´e 3´. A região não traduzida 5´ é fundamental para a replicação do vírus, que, complementar a fita negativa, serve de iniciadora para síntese da nova fita de sentido positivo (3,13).
Ao final da síntese, inicia-se a fase de montagem da estrutura viral. Partículas imaturas da proteína E interagem com a proteína prM, impedindo que altere sua conformação no pH intracelular, que levaria a uma exocitose precoce. Após o arranjo do vírion a proteína prM é clivada por enzima e a partícula viral é liberada por exocitose (3,4,13).
A existência de um alto título de anticorpos está associada a febre hemorrágica da dengue (FHD) (14,15). Assim, a condição para a forma hemorrágica da doença não está necessariamente associada a um subtipo específico. Sabe-se também que a contração de um dos subtipos do vírus leva a formação de anticorpos de memória que impedem a reinfecção pelo mesmo sorotipo, e até uma imunidade temporária contra os demais (14,16,17). O DENV-1, entretanto, tem maior taxa de replicação, sendo o mais frequente em todo o mundo, enquanto o DENV-3 é um tipo mais virulento (5,18).
Embora a melhor maneira de evitar epidemias seja controlar os vetores, compreender a estrutura do vírus e seus mecanismos de entrada nas células são cruciais para estabelecer barreiras imunológicas mais eficientes. Visando observar a preservação da membrana do DENV, foi escolhida a proteína E, responsável pela ligação do vírus à célula, para análise filogenética, comparando-a entre os quatro subtipos da doença, para identificar os pontos mais favoráveis para mutação, analisando se elas influenciaram em alterações na transcrição de suas proteínas.
(continua…)