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PRODUÇÃO TEXTUAL NA ESCOLA: perspectivas e desafios em uma abordagem dialógica

PRODUÇÃO TEXTUAL NA ESCOLA: perspectivas e desafios em uma abordagem dialógica

O artigo “Produção textual na escola: um desafio a ser superado”, de Francisco Lucas Ferreira Barbosa e Aida Maria Bandeira de Sousa, aborda a complexidade da produção textual no ambiente escolar, buscando oferecer alternativas para professores de Língua Portuguesa. O estudo fundamenta-se nas teorias de dialogismo de Mikhail Bakhtin (2003) e nas discussões sobre produção textual de Irandé Antunes (2003). A metodologia empregada é a pesquisa bibliográfica. Os autores propõem estratégias para a produção textual em uma perspectiva dialógica no contexto escolar.

A prática da escrita na escola representa um desafio contínuo para professores e alunos, que são leitores e produtores de textos em formação. Este artigo discute a produção textual no ambiente escolar sob uma perspectiva aberta e dialógica, enfatizando a importância da escrita e estratégias para seu desenvolvimento tanto na sala de aula quanto fora dela, argumentando que o currículo escolar deve estar interligado com a sociedade e a vida cotidiana dos estudantes. A base teórica para essa discussão reside nos postulados sobre dialogismo de Mikhail Bakhtin (2003) e nos preceitos sobre produção textual de Irandé Antunes (2003). A pesquisa é compreendida como um procedimento formal, com um método de pensamento reflexivo que exige tratamento científico, sendo um caminho para compreender a realidade ou descobrir verdades parciais.

O artigo destaca a relevância da discussão para professores, estudantes e a sociedade em geral, pois, ao abordar a escrita de forma dialógica e interacionista, contribui para desmistificar o receio dos estudantes em relação à produção textual em sala de aula, o que pode gerar impactos positivos no processo de aprendizagem e na sociedade.

No que tange ao sujeito produtor de textos, o estudo defende que ele deve estar “situado”, ou seja, precisa considerar o contexto complexo em que atua e o princípio dialógico, que inclui elementos sociais e históricos. Escrever não é apenas uma ação mecânica, mas uma atividade que demanda um sujeito conectado com seu universo interior e exterior, influenciado por sua compreensão de mundo, leituras, músicas e vivências. Bakhtin (2003) salienta que a interação com a palavra do outro tem sido negligenciada pelas ciências humanas, e que todas as nossas ações e experiências são perpassadas pela visão e palavra alheia. Assim, estar situado significa estar conectado às notícias, conversas e leituras, ou seja, ao “grande tempo” que o cerca. A escrita, conforme Antunes (2005), é uma atividade inerentemente orientada e dotada de sentido, exigindo responsividade tanto do produtor quanto do leitor. Sobral (2021) complementa que o sujeito é um agente e organizador de discursos, responsável por seus atos e responsivo ao outro, possuindo um “excedente de visão” em relação ao outro, ao mesmo tempo em que depende do outro para se autoconhecer. O sujeito imerso na produção textual deve compreender que está em constante diálogo com a “palavra do outro”, que engloba qualquer palavra de outra pessoa, dita ou escrita, que não seja a sua própria.

A prática da escrita, quando situada e planejada, pode ser uma fonte de prazer, apesar de envolver desafios e a necessidade de reescritas e persistência. Antunes (2003) descreve a escrita como uma modalidade de interação verbal onde os sujeitos não ocupam o mesmo espaço e há um lapso temporal entre a elaboração do texto e sua leitura. Isso implica que a escrita requer um planejamento, a elaboração de um Projeto de Texto (PT). Para um PT consistente, o estudante deve: delimitar o tema e sua unidade, eleger os objetivos, escolher o gênero textual/discursivo, definir os critérios de ordenação das ideias e prever as condições dos leitores e a formalidade linguística do texto.

É crucial que a escrita não seja imposta de forma verticalizada, sem que o estudante saiba o propósito, o público ou o gênero. Tal modelo de ensino é considerado fadado ao fracasso. A escrita é uma atividade de impacto social, e todos dialogamos com outros textos, pois “a vida é dialógica por natureza”. A discussão sobre produção textual leva à reflexão sobre a importância dos gêneros discursivos nas aulas de Língua Portuguesa na Educação Básica. O contato com uma maior diversidade de gêneros pode facilitar o desenvolvimento da reflexão e da produção textual nos estudantes.

Antunes (2003) também delineia as etapas da produção textual, que não se restringem apenas ao planejamento, mas incluem “etapas distintas e intercomplementares”. As etapas são: Planejar, Escrever e Reescrever. Na etapa de Planejar, o sujeito deve ampliar seu repertório, delimitar o tema e o ponto de vista, eleger o objetivo, escolher os critérios de ordenação das ideias e prever as condições dos leitores. A etapa de Escrever envolve colocar no papel o que foi planejado e realizar a tarefa motora da escrita. Por fim, a etapa de Reescrever consiste em rever o que foi escrito, confirmar se os objetivos foram cumpridos, avaliar a continuidade temática, observar a concatenação entre períodos e parágrafos, e avaliar a clareza, adequação e fidelidade linguística do texto. Tradicionalmente, a escola tem se concentrado na etapa de escrever, priorizando a correção gramatical.

Para superar a ideia de que a boa produção textual é um “dom”, é necessário que o professor e o aluno reflitam e apliquem as questões levantadas por Antunes (2003), entendendo que um bom texto resulta de planejamento, organização e orientação.

A transição do parágrafo para o texto é um aspecto importante. Sena (2017) aponta que um texto possui uma lógica interna de construção, com uma ideia central que se desdobra em detalhes e culmina em uma conclusão. As partes do texto (início, meio e fim) devem estar articuladas, formando um corpo coeso e consistente. Othon Garcia (1969) define parágrafo como uma unidade de composição que desenvolve uma ideia central, à qual se agregam ideias secundárias relacionadas. A sequência lógica dos parágrafos contribui para a ordenação das ideias no texto como um todo. A construção textual pode ser comparada a um mosaico, onde a junção das partes forma um todo dotado de sentido e significação. O processo de elaboração do parágrafo inclui a escolha do tema, o objetivo, a frase-núcleo, o desenvolvimento e a frase conclusiva. Sena (2017) ainda destaca três qualidades de um bom parágrafo: unidade, coerência e coesão. Koch e Elias (2022) afirmam que falar de texto é falar de sentidos, construídos na relação entre autor, texto e leitor. A produção textual não é monológica, mas dialógica. O leitor também produz sentidos, e todo texto exige responsividade, permitindo ao leitor concordar, discordar, adicionar ou refutar as ideias do autor. Todo falante é um respondente, pressupondo a existência de enunciados anteriores com os quais seu próprio enunciado dialoga.

Orlandi (1993) destaca as exigências para o autor na produção textual, incluindo coerência, respeito às normas, explicitação, clareza, conhecimento das regras textuais, originalidade, relevância, unidade, não-contradição, progressão e duração do discurso. O processo de produção textual exige uma “relação institucional com a linguagem”, e a linguagem proporciona múltiplas formas de “fazer textos”, tornando as aulas de Língua Portuguesa mais atrativas e significativas. A escrita deve servir às práticas sociais, sendo “escrita na vida e para a vida”. É fundamental que o docente tenha clareza sobre a concepção de língua adotada em sua prática, o que influenciará suas abordagens. Marcuschi (2008) apresenta diferentes concepções de língua: como forma ou estrutura, como instrumento, como atividade cognitiva e como atividade sociointerativa situada. A construção do parágrafo e do texto ocorre conjuntamente, sendo a separação uma forma de facilitar a compreensão das etapas.

Os desafios para a produção textual na sala de aula são complexos e exigem mudanças na abordagem pedagógica. A ausência de práticas contínuas de escrita é um dos maiores desafios, pois muitas vezes a escrita é vista como uma atividade pontual. É necessário que a produção textual seja constante e diversificada, abrangendo diferentes gêneros e contextos. A cultura escolar frequentemente valoriza excessivamente a gramática normativa em detrimento da prática da escrita, com o ensino tradicional privilegiando regras descontextualizadas. O ensino de produção textual deve ir além da teoria e oferecer experiências reais de escrita.

Outro desafio é a dificuldade na correção dos textos e na oferta de feedback eficaz. A correção é um processo demorado e subjetivo, podendo sobrecarregar o professor. Quando o feedback se limita a aspectos gramaticais e ortográficos, o aluno pode não compreender seus avanços e dificuldades reais. Para superar isso, são necessárias estratégias de correção formativas, com comentários detalhados, propostas de reescrita e uso de rubricas avaliativas. Atividades colaborativas, como a revisão entre pares, também podem auxiliar no desenvolvimento da visão crítica dos estudantes.

A tecnologia, com o uso de redes sociais e aplicativos, influencia a escrita dos alunos, tornando-a mais informal e com abreviações. Em vez de ser vista como ameaça, a tecnologia pode ser uma aliada, com ferramentas digitais como blogs e fóruns estimulando a escrita em diferentes formatos e engajando os alunos. O estudo de gêneros textuais digitais pode ser incorporado ao currículo para que os estudantes compreendam as variações linguísticas e a adequação da linguagem aos diferentes contextos comunicativos. A superação desses desafios envolve a valorização da escrita como prática contínua, o aprimoramento das estratégias de correção e feedback, e a integração construtiva da tecnologia no processo de ensino-aprendizagem, visando formar alunos com autonomia, criticidade e competência na escrita.

Em conclusão, o artigo ressalta a necessidade de pensar em alternativas viáveis para a produção textual em sala de aula, o que implica abertura para novas práticas pedagógicas. Compreender a escrita como um processo necessário e prazeroso na jornada acadêmica e pessoal é fundamental. O diálogo na sala de aula, a partir da voz dos estudantes, é um ponto chave no processo de ensino-aprendizagem com foco na produção textual, sendo necessário superar o monologismo e criar espaços de escuta atenta e reflexão sobre a escrita.

Referência:

BARBOSA, F. L. F.; SOUSA, A. M. B. Produção textual na escola: um desafio a ser superado. Open Minds International Journal, São Paulo, v. 6, n. 1, p. 18-27, jan./abr. 2025.

 

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