A obesidade, um desafio global de saúde em ascensão, afeta uma parcela crescente da população mundial, com projeções indicando que quase 20% dos adultos, ou seja, aproximadamente um bilhão de indivíduos, podem ser obesos até 2025. Embora as mudanças na disponibilidade e no consumo de alimentos sejam fatores determinantes nesse aumento, a genética tem se destacado como um pilar fundamental na predisposição à adiposidade em ambientes obesogênicos. Estudos com gêmeos, familiares e de adoção estimam que a herdabilidade da obesidade varia entre 40% e 77%.
Nesse cenário, a nutrigenética, um ramo da genética, investiga a influência da variação genética nas respostas individuais aos componentes da dieta. Essa área oferece um potencial significativo para a abordagem personalizada da obesidade e de outras condições relacionadas à dieta. As estratégias convencionais de perda de peso frequentemente adotam uma abordagem “tamanho único”, que desconsidera a heterogeneidade inerente à obesidade e a diversidade de respostas individuais. Dietas hipocalóricas, por exemplo, demonstram variabilidade em sua eficácia, o que evidencia a necessidade de cuidados mais personalizados.
A pesquisa tem se voltado para a compreensão do impacto de macronutrientes específicos na perda de peso. Isso se deve à percepção de que diferentes macronutrientes podem promover a perda de peso de maneiras mais eficazes, e que “nem todas as calorias são iguais”. A metabolização de diversas fontes de proteína, tipos de açúcares, aminoácidos e ácidos graxos (saturados, monoinsaturados, poliinsaturados ou trans) difere conforme o perfil genético de cada indivíduo.
A adaptação do consumo de macronutrientes com base no perfil genético é crucial para a perda de peso. No que tange aos carboidratos, a qualidade e a fonte são mais relevantes do que a quantidade total. Por exemplo, indivíduos com alta pontuação de risco genético (GRS) para obesidade são mais suscetíveis ao aumento do Índice de Massa Corporal (IMC) ao consumir bebidas açucaradas. A variação no número de cópias do gene da amilase salivar (AMY1) também influencia a digestão de carboidratos e a adiposidade, especialmente em dietas ricas em carboidratos.
Em relação aos lipídios, a ingestão de gordura saturada, por exemplo, tem sido associada a um risco elevado de obesidade em indivíduos com alta GRS, enquanto o consumo de ácidos graxos poli-insaturados (PUFAs) pode mitigar esses efeitos genéticos. O polimorfismo -265 T>C (rs5082) no gene da apolipoproteína A-II (APOA2) é um exemplo, onde homozigotos CC apresentam maior risco de obesidade com dietas ricas em gordura saturada, mas não com dietas com baixo teor desse tipo de gordura.
Dietas ricas em proteínas também mostram respostas variáveis dependendo do perfil genético. Indivíduos com alta GRS para obesidade podem ser mais suscetíveis à adiposidade com proteínas de origem animal, mas observam a tendência oposta com proteínas vegetais. Polimorfismos no gene FTO (associado à massa gorda e obesidade), MC4R, BDNF e TFAP2B influenciam a resposta à ingestão de proteínas e à perda de peso em dietas hipocalóricas.
A fibra alimentar também desempenha um papel importante. Um estudo demonstrou que crianças e adolescentes com alto risco poligênico (PRS) para obesidade atenuaram o risco ao consumir uma dieta rica em fibras. Além disso, a ingestão de fibras está ligada à proteção contra diabetes tipo 2, especialmente em indivíduos sem o alelo de risco TCF7L2 rs7903146.
Além da dieta, fatores genéticos também orientam as respostas a mudanças no estilo de vida, como o exercício físico e a crononutrição. O jogging regular, por exemplo, tem se mostrado eficaz na mitigação do risco genético de obesidade. O horário das refeições também é influenciado geneticamente, com evidências sugerindo que comer fora de hora pode agravar a adiposidade em indivíduos geneticamente predispostos.
A compreensão aprofundada da paisagem genética subjacente à obesidade é fundamental para o desenvolvimento de estratégias de prevenção e manejo mais eficazes. A integração de variantes genômicas acionáveis com recomendações de estilo de vida e intervenções personalizadas, impulsionada por tecnologias como aprendizado de máquina e inteligência artificial, tem o potencial de revolucionar a nutrição de precisão para o manejo do peso corporal. A visão futura da nutrição de precisão envolve a utilização de “gêmeos digitais”, réplicas virtuais de indivíduos que integram uma vasta gama de informações (genética, microbioma, respostas imunes, metabolismo, estilo de vida), oferecendo insights dinâmicos para otimizar recomendações dietéticas personalizadas.
Referência:
Gkouskou, K. K., Grammatikopoulou, M. G., Lazou, E., Vasilogiannakopoulou, T., Sanoudou, D., & Eliopoulos, A. G. (2024). A genomics perspective of personalized prevention and management of obesity. Human Genomics, 18(1), 4. https://doi.org/10.1186/s40246-024-00570-3.
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