Pacientes que não sobreviveram à hospitalização pela Covid-19 em Wuhan, na China, tinham maior probabilidade de ser mais velhos, ter comorbidades e altos níveis de dímero D, de acordo com o primeiro estudo analisando os fatores de risco associados à morte entre adultos hospitalizados com a doença causada pelo vírus SARS-CoV-2.
“A idade mais avançada, ter sinais de sepse no momento da internação, ter doenças concomitantes como hipertensão arterial sistêmica e diabetes, e o uso prolongado de ventilação não invasiva foram fatores importantes na morte desses pacientes”, disse o coautor Dr. Zhibo Liu em um comunicado à imprensa. Alterações da coagulação também fizeram parte do quadro clínico.
O Dr. Fei Zhou, da Academia Chinesa de Ciências Médicas, e colaboradores, fizeram um estudo de coorte observacional retrospectivo, multicêntrico com 191 pacientes, dos quais 137 tiveram alta e 54 morreram no hospital.
O estudo, publicado on-line em 09 de março no periódico Lancet, foi feito com todos os pacientes adultos com confirmação laboratorial da Covid-19 que haviam tido alta ou morrido até 31 de janeiro deste ano no Hospital de Jinyintan e no Hospital de Pneumologia de Wuhan. Os pacientes gravemente doentes nas províncias foram transferidos para esses hospitais até 1ª de fevereiro.
Os pesquisadores compararam as características demográficas e clínicas, os dados laboratoriais e o tratamento nos prontuários eletrônicos dos pacientes que sobreviveram e dos que sucumbiram à doença. A análise também testou amostras seriadas de RNA viral.
No total, 91 (48%) dos 191 pacientes tinham comorbidades. A mais comum era hipertensão arterial sistêmica (30%), seguida de diabetes (19%) e da doença coronariana (8%).
A probabilidade de morrer no hospital aumentou com a idade (razão de chances ou odds ratio, OR, de 1,10; intervalo de confiança, IC, de 95%, de 1,03 a 1,17 por aumento de um ano na idade), pontuação mais alta pela escala Sequential Organ Failure Assessment (SOFA) (5,65, de 2,61 a 12,23; P < 0,0001) e níveis de dímero D acima de 1 μg/L na internação.
O SOFA já foi chamado de “pontuação de falência de órgãos relacionada com a sepse” e avalia o grau de falência dos órgãos nas unidades de tratamento intensivo. Altos níveis de dímero D indicam maior risco de alterações da coagulação, como trombose venosa profunda.
Ao comparar os que não sobreviveram aos que sobreviveram, os primeiros tiveram maior incidência de insuficiência respiratória (98% vs. 36%), sepse (100% vs. 42%) e infecção secundária (50% vs. 1%).
A média de idade dos sobreviventes foi de 52 anos, em comparação a 69 anos dos que morreram. Liu mencionou o enfraquecimento do sistema imunitário e o aumento da inflamação, que lesa os órgãos e também promove a replicação viral, como explicação para o efeito da idade.
Desde o momento de início dos sintomas, a mediana do tempo até a alta hospitalar foi de 22 dias. O tempo médio até a morte foi de 18,5 dias.
A febre persistiu por uma mediana de 12 dias entre todos os pacientes, e a tosse persistiu por uma mediana de 19 dias; 45% dos sobreviventes ainda tossiam no momento da alta. Entre os sobreviventes, a dispneia melhorou após 13 dias, mas persistiu até a morte nos outros pacientes.
A disseminação viral persistiu por uma duração mediana de 20 dias entre os sobreviventes, variando de 8 a 37 dias. O SARS-CoV-2 permaneceu detectável até a morte entre os que não sobreviveram. O tratamento antiviral não diminuiu a disseminação viral.
Mas os dados sobre a disseminação viral vieram com uma advertência. “A disseminação viral prolongada observada no nosso estudo tem implicações importantes para orientar as decisões sobre as precauções de isolamento e o tratamento antiviral dos pacientes com diagnóstico confirmado da Covid-19. No entanto, precisamos dizer claramente que tempo de disseminação viral não deve ser confundido com outras orientações de isolamento voluntário para as pessoas que possam ter sido expostas à Covid-19, mas estão assintomáticas, já que esta orientação se baseia no período de incubação do vírus”, explicou o coautor Dr. Bin Cao.
“Idade mais avançada, níveis elevados de dímero D e alta pontuação na escala SOFA poderiam ajudar os médicos a identificar precocemente os pacientes com Covid-19 cujo prognóstico é reservado. A disseminação viral prolongada provê o fundamento teórico da estratégia de isolamento dos pacientes infectados e de futuras intervenções antivirais otimizadas”, concluem os pesquisadores.
Uma limitação na interpretação dos resultados do estudo é que os pacientes internados não representam toda a população infectada. Os pesquisadores advertem que “o número de mortes não reflete a verdadeira mortalidade da Covid-19”. Os autores também indicam que não têm material genético suficiente para avaliar com exatidão a duração da disseminação viral.
The Lancet. Publicado on-line em 09 de março de 2020. Texto completo
Com informações de Medscape.