O conto “Teresa” de Rosario Orrego, traduzido por Fábio Marques de Souza e Heloisa Costa Rigon, publicado no Open Minds International Journal, volume 6, número 1 de 2025, aborda de forma pungente os dilemas morais e os sacrifícios pessoais enfrentados durante o período da Independência do Chile em 1813. A narrativa explora os complexos conflitos de lealdade entre o amor romântico e o fervor patriótico, personificados nas figuras de Teresa, Luís e Jenaro.
A trama se inicia em um cenário de tensão, com os chilenos em batalha contra o exército espanhol. A chegada de um navio corsário espanhol, o Warren, incita os patriotas a agir, mobilizando recursos escassos para equipar navios e capturá-lo. Nesse contexto, Teresa, uma jovem de 19 anos, e seu irmão Luís, um patriota convicto, se preparam para os desdobramentos da guerra. Luís, que até então contribuíra com a independência apenas financeiramente, anseia por uma participação mais ativa, planejando unir-se ao general Carrera após o casamento de Teresa com Jenaro. A postura de Teresa, que expressa o desejo de “morrer como nosso pai, em defesa da pátria” , revela a profundidade de seu patriotismo e a influência do legado familiar em suas convicções.
O conflito central emerge com a figura de Jenaro, um jovem espanhol que, apesar de seu relacionamento com Teresa, se revela um traidor da causa patriota. Ele suborna um marinheiro italiano para sabotar a fragata Perla, entregando-a ao inimigo. A descoberta da traição de Jenaro provoca um rompimento irremediável com Teresa, que o confronta com a verdade, afirmando que a memória de seu pai, morto pela pátria, cria um abismo entre eles. Este evento ilustra como as lealdades políticas podem desmantelar relações pessoais profundas, forçando indivíduos a escolher entre afetos e princípios ideológicos.
Posteriormente, o enredo se aprofunda nos desafios enfrentados pelos patriotas presos em Santiago, vítimas da derrota de Rancagua. Luís é um desses prisioneiros, e uma conspiração para a liberdade é tramada, com a confiança depositada em um sargento espanhol, Villalobos, que mais tarde se revela um traidor. A cena do massacre dos prisioneiros na prisão, onde a “carniceira então fez-se geral” , destaca a brutalidade do conflito e a vulnerabilidade dos que lutavam pela independência. No entanto, Jenaro, agora major general, intervém para salvar Luís e outros, um ato que, embora paradoxal dada sua traição anterior, demonstra a complexidade de seu caráter e as ambiguidades da guerra.
O desfecho do conto é particularmente significativo ao solidificar a decisão de Teresa. Embora Jenaro a ame e a salve, a lealdade de Teresa à pátria supera seu amor por ele. Ela recusa a união, questionando se poderia se casar com alguém que “contribui em derramar o sangue dos meus irmãos”. O sacrifício de seu amor em prol da liberdade da nação é o ponto culminante da narrativa, sublinhando a primazia da pátria sobre os sentimentos individuais. A despedida final entre Teresa e Jenaro, com a promessa de reencontro “Quando minha pátria for livre”, enfatiza que, em tempos de conflito, a identidade nacional e a busca pela liberdade podem exigir sacrifícios pessoais inestimáveis. O conto, portanto, serve como um poderoso lembrete das tensões e escolhas difíceis inerentes aos movimentos de independência, onde o destino individual se entrelaça inseparavelmente com o destino coletivo de uma nação.
Referência:
SOUZA, F. M.; RIGON, H. C. Teresa. Open Minds International Journal, São Paulo, v. 6, n. 1, p. 242-251, jan./abr. 2025.
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