Avaliação e Tratamento da Comorbidade entre Autismo e TDAH: Diretrizes para uma Prática Clínica e Educacional Integrada

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) e o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) são transtornos do neurodesenvolvimento prevalentes, e o reconhecimento formal da sua coocorrência no DSM-5 sublinha a necessidade de abordagens de prática clínica e educacional que considerem a interação entre as duas condições. Indivíduos com a dupla excepcionalidade exibem maior comprometimento em diversas áreas, incluindo o funcionamento cognitivo, psicossocial e a presença de comorbidades adicionais. Uma revisão de literatura recente oferece diretrizes práticas para a avaliação e o tratamento dessa população, destacando a importância de uma abordagem colaborativa e baseada em evidências.

Avaliação de Alta Qualidade
A avaliação da comorbidade entre TEA e TDAH é complexa devido à sobreposição de sintomas, o que pode dificultar o diagnóstico diferencial. É crucial evitar o “diagnóstico por ensombramento”, assumindo que todos os sintomas de uma condição são atribuíveis à outra. O processo de avaliação deve ser abrangente e multifacetado, incluindo:
Parceria Colaborativa: A avaliação deve ser uma colaboração entre famílias, profissionais de saúde e educadores, utilizando processos de tomada de decisão compartilhada.

História de Desenvolvimento e Entrevistas: É fundamental obter uma história de desenvolvimento detalhada com os pais e, quando apropriado, com o próprio jovem. Entrevistas estruturadas ou semiestruturadas ajudam a contextualizar os sintomas e a verificar a sua cronicidade e manifestação em diferentes situações.

Escalas de Avaliação Múltiplas: Questionários validados e preenchidos por múltiplos informantes, como pais e professores, são essenciais para documentar o comportamento em diferentes contextos.

Avaliação Cognitiva e Observação Direta: A avaliação das habilidades cognitivas e a observação direta dos sintomas são importantes, especialmente para verificar o nível de desenvolvimento e para diagnosticar o TEA, para o qual o ADOS-2 é a ferramenta de referência.
A integração de todas essas informações é vital para chegar a um diagnóstico preciso, considerando o perfil único de pontos fortes e fracos de cada indivíduo.

Estratégias de Intervenção
As intervenções devem ter como objetivo principal reduzir o comprometimento e a incapacidade, alinhando-se aos objetivos da criança e da família. Embora a pesquisa sobre intervenções específicas para a comorbidade ainda seja limitada, é possível adaptar estratégias eficazes para cada transtorno.

Manejo Comportamental: Estratégias comportamentais, como o reforço de comportamentos desejados e a ignorância de comportamentos inadequados, são recomendadas para ambos os transtornos. Em crianças com TEA e TDAH, o treinamento comportamental para pais pode reduzir comportamentos disruptivos e a hiperatividade.

Intervenções Escolares e Acadêmicas: Intervenções escolares focadas no manejo de contingências na sala de aula têm mostrado efeitos positivos no comportamento e no desempenho acadêmico de crianças com TDAH. O treinamento de habilidades organizacionais pode ser benéfico para alunos com TDAH e também para adolescentes autistas.

Treinamento de Habilidades Sociais: O treinamento de habilidades sociais deve abordar tanto a falta de conhecimento social (comum no TEA) quanto as dificuldades de desempenho (características do TDAH).

Manejo Medicamentoso: Medicamentos estimulantes e não estimulantes podem ser eficazes na redução dos sintomas do TDAH em crianças e adolescentes com a comorbidade. No entanto, a taxa de resposta a estimulantes é mais baixa (cerca de 50%) do que em crianças com TDAH isoladamente (70-90%) e o risco de efeitos colaterais é maior.

Em conclusão, a coocorrência de TEA e TDAH é um desafio complexo que exige um modelo integrado de avaliação e intervenção. A colaboração entre pais, educadores e clínicos especializados é fundamental para um diagnóstico preciso e para a implementação de estratégias de tratamento eficazes e personalizadas que melhorem a qualidade de vida desses jovens.

Referência:

Hatch, B., Kadlaskar, G., & Miller, M. (2023). Diagnosis and treatment of children and adolescents with autism and ADHD. Psychology in the Schools, 60(2), 295–311. doi: 10.1002/pits.22808.

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