O Transtorno do Espectro Autista (TEA) e o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) são condições neurodesenvolvimentais que, embora distintas, frequentemente coocorrem e apresentam sobreposições comportamentais e neurobiológicas significativas. Estima-se que a prevalência de TDAH em indivíduos com TEA varie entre 16% e 80%. Para melhor compreender a complexa relação entre esses transtornos, um estudo de ressonância magnética estrutural (MRI) investigou as diferenças neuroanatômicas em indivíduos com TEA e TDAH em comparação com grupos com apenas um dos diagnósticos ou nenhum.
O estudo, que utilizou dados de 533 indivíduos do Projeto Europeu de Autismo Longitudinal (LEAP), analisou a espessura cortical (CT) e a área de superfície (SA) do cérebro. Os resultados revelaram efeitos principais significativos tanto para o TEA quanto para o TDAH em regiões frontotemporais, límbicas e occipitais. No entanto, a análise mais aprofundada indicou que a neuroanatomia do TEA é significativamente modulada pela presença de TDAH. Foi observada uma interação significativa entre TEA e TDAH no giro pré-central esquerdo para medidas de espessura cortical e no giro frontal direito para área de superfície. Além disso, indivíduos com a dupla excepcionalidade (TEA + TDAH) apresentaram uma espessura cortical significativamente menor em certas regiões, como o giro pré-central esquerdo, em comparação com aqueles que tinham apenas TEA.
Para aprofundar a compreensão dessas descobertas, o estudo vinculou os achados neuroanatômicos a possíveis bases genômicas, utilizando dados de expressão gênica do Allen Human Brain Atlas. As análises de enriquecimento genético mostraram que os padrões de espessura cortical e área de superfície, tanto nos efeitos principais quanto na interação entre os transtornos, estavam significativamente enriquecidos para genes relacionados ao autismo, mas não para genes associados ao TDAH. No entanto, um padrão de variabilidade neuroanatômica na área de superfície, associado ao TDAH, também mostrou um enriquecimento robusto de genes relacionados ao autismo. Isso sugere que esses genes podem não ser específicos apenas para o autismo, mas também podem influenciar a neuroanatomia de outros transtornos do neurodesenvolvimento, como o TDAH. Essa descoberta está alinhada com estudos genéticos anteriores que indicaram uma correlação genética entre TEA e TDAH.
Em conclusão, o estudo demonstra que é possível distinguir os efeitos do TEA e do TDAH no nível neuroanatômico e que a comorbidade modula de maneira significativa a neuroanatomia do TEA. As descobertas sugerem que indivíduos autistas com TDAH podem ter bases neuroanatômicas específicas, possivelmente mediadas por uma expressão gênica atípica. Tais insights são cruciais para a compreensão do complexo fenótipo clínico do autismo e reforçam a necessidade de pesquisas futuras com amostras maiores e abordagens dimensionais para capturar a heterogeneidade individual associada a esses transtornos.
Referência:
Berg, L. M. et al. The neuroanatomical substrates of autism and ADHD and their link to putative genomic underpinnings. Molecular Autism, 14(36) (2023).
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