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Alta Inteligência e o Bloqueio Eficiente: Quando a Vontade Não é Falta de Disciplina, mas Seleção Neural

Alta Inteligência e o Bloqueio Eficiente: Quando a Vontade Não é Falta de Disciplina, mas Seleção Neural

Por Dr. Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues, Pós PhD em Neurociências, Especialista em Genômica e Comportamento Humano

O dilema não é apenas fazer ou não fazer. É por que o cérebro decide que não vale a pena.

No senso comum, a inteligência costuma ser associada ao rendimento acadêmico, à capacidade de cumprir tarefas ou à persistência diante de conteúdos desinteressantes. Contudo, ao longo de minha trajetória como neurocientista e estudioso da cognição humana, e como observador direto de cérebros considerados fora da curva, compreendi que há nuances pouco compreendidas sobre o que realmente configura a “alta inteligência”.

Tenho exemplos diretos em minha própria casa. Um enteado com diagnóstico de autismo, extremamente funcional, disciplinado, com excelentes notas. Outra, neurotípica, com um perfil genético associado à inteligência superior, que simplesmente se recusa a estudar conteúdos que não lhe interessam. Ela não é “rebelde”. Ela não é indisciplinada. Seu cérebro, literalmente, bloqueia o que não faz sentido.

Não é preguiça. É filtro cognitivo de alta performance.

Concluí num recente estudo, que o cérebro de indivíduos com QI superior a 150 apresenta um padrão diferenciado de seletividade neural. Isso é observável em mapeamentos funcionais e confirmado por dados genéticos que modulam receptores dopaminérgicos e vias inibitórias. Esses indivíduos possuem um circuito de relevância hiperajustado. Em outras palavras, há uma inibição ativa de estímulos considerados banais ou redundantes. Eles não procrastinam porque não sabem se controlar. Eles simplesmente não veem propósito.

Poderíamos chamar isso de “bloqueio eficiente”. É a mesma função que os protege de memórias traumáticas (o que pode parecer, paradoxalmente, alta inteligência emocional) e que reduz o ruído mental em ambientes de alta complexidade.

Mas então quem é mais funcional? O que faz por obrigação ou o que bloqueia por seleção?

Um sujeito com QI entre 130–140 tende a ser disciplinado. Estuda o que gosta e o que não gosta, porque compreende que “é preciso fazer”. Pode até sofrer com o tédio ou o desinteresse, mas se adapta. Já um indivíduo na faixa de 150–160 ativa outro sistema: ele ignora. Não por desleixo, mas por inibição voluntária de circuitos que consideram aquela informação irrelevante no mapa sináptico da utilidade.

Ambos os perfis podem obter resultados. Ambos podem atingir excelência. A diferença está na via cognitiva. Um busca adequação, o outro, relevância.

A escola tradicional premia o obediente. A inovação nasce no que desvia.

Enquanto o primeiro perfil é valorizado no modelo educacional convencional, o segundo é frequentemente taxado como “preguiçoso”, “difícil” ou “desinteressado”. No entanto, foi esse segundo grupo que originou empreendedores precoces, criadores de tecnologias disruptivas, teóricos radicais.

Conclusão: Inteligência não é só performance. É também recusa.

O verdadeiro desafio é entender que a inteligência elevada pode se manifestar tanto na persistência quanto no bloqueio. A disciplina pode ser sinal de esforço cognitivo, mas o desprezo por tarefas banais pode ser uma forma de proteção sináptica e não de negligência.

Ignorar isso é patologizar o gênio que apenas escolheu não desperdiçar energia com o óbvio.

Dr. Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues
Pós PhD em Neurociências | Especialista em Genômica e Comportamento
Centro de Pesquisa e Análises Heráclito (CPAH)
Membro da Society for Neuroscience (EUA), Royal Society of Biology (UK), e da Sigma Xi Honor Society