Alterações climáticas tornam mais frequentes doenças como língua azul

A língua azul apareceu em Portugal pela primeira vez em 2004, pelo que a doença “não é nenhuma novidade” e o que é novo é o serotipo 3, que já tinha aparecido este ano na Bélgica e em França

As doenças animais transmitidas por picadas de insetos, como a língua azul, com grande expansão no Alentejo, são cada vez mais frequentes em Portugal devido às alterações climáticas, afirmou esta quarta-feira um professor na Universidade de Évora (UÉ).

Em declarações à agência Lusa, Ricardo Romão, docente do Departamento de Zootecnia e também médico veterinário, considerou que “as doenças vetoriais [só se transmitem através da picada do inseto] estão a aparecer com muito mais incidência”.

Sabe-se que é por causa das alterações climáticas”, pois “os vírus que normalmente circulavam no norte de África têm subido a latitude e acompanhado o aumento das temperaturas, nomeadamente no final do verão e no outono”, referiu.

Ricardo Romão falava a propósito do novo serotipo 3 da febre catarral ovina, conhecida como doença da língua azul, que foi detetado, pela primeira vez, em meados de setembro, no distrito de Évora, tendo alastrado, desde então, a todo o Alentejo.

Assinalando que as atuais temperaturas são “propícias à transmissão de vírus”, o docente frisou que estão em circulação, pelo menos, três em espécies pecuárias, concretamente, além da língua azul, a doença hemorrágica epizoótica e o vírus do Nilo.

São todas doenças transmitidas por vetores, insetos, mosquitos, que não conhecem fronteiras e são muito difíceis de controlar apenas pela movimentação animal, porque não impede que os mosquitos progridam”, realçou.

O também médico veterinário disse esperar que “o vírus [da língua azul] vá desaparecendo com o frio”, que vai aumentar com o aproximar do inverno, porque o inseto que o transmite não suporta baixas temperaturas, mas previu que ainda vai continuar a circular devido às atuais condições amenas.

Segundo este professor da UE, a língua azul apareceu em Portugal pela primeira vez em 2004, pelo que a doença “não é nenhuma novidade” e o que é novo é o serotipo 3, que já tinha aparecido este ano na Bélgica e em França.

É uma doença que afeta animais que estejam em situação imunitária mais degradada ou em fase metabólica mais complicada, como ovelhas em pré-parto ou mais magras e mais velhas e também borregos já com alguns meses”, salientou.

Quanto aos sintomas, Ricardo Romão descreveu que os animais com a doença ficam com “lesões nas mucosas, nomeadamente na boca, a inflamação típica da cabeça e deixam de se alimentar e, com isso, também ficam mais fracos”, além de ficarem menos ativos.

A doença aparece quase despercebida”, já que os animais “ficam com febre e, depois, vão acabar por desenvolver a doença passado dois ou três dias e, muitas vezes, o quadro começa a agravar-se a partir daí”, relatou.

Aludindo a relatos de criadores e ao que tem visto em explorações, o docente adiantou que, quando a língua azul atinge um rebanho, muitos dos animais ficam infetados, admitindo cerca de 70%, acabando por morrer 10% a 20%.

Só conseguimos controlar isto através da vacinação e das medidas de desinsetização que já são preconizadas há muitos anos”, vincou, apontando como um dos problemas o desconhecimento sobre se um rebanho a vacinar já tem a doença em desenvolvimento.

De acordo com o médico veterinário, a vacina contra o vírus “é preventiva e não curativa” e deve ser aplicada apenas a animais que não estão infetados, porque não vai ser eficaz em animais que já tenham a doença.

A língua azul, que não é transmissível a humanos, é de declaração obrigatória e as explorações onde seja confirmada a doença ficam impedidas de movimentar animais durante 60 dias.

A ‘ganhar terreno’ no Alentejo, a doença da língua azul está a dizimar rebanhos e já matou milhares de animais, provocando prejuízos aos criadores, que se queixam de falta de apoios.

A Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) já reclamou a intervenção urgente do Governo, enquanto a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) pediu uma campanha de vacinação gratuita dos animais e um apoio extraordinário aos produtores.

 

Matéria – CNN, Agência Lusa , AM

Imagem – GZH, DDA / Seapi,Divulgação