O filme “Central do Brasil” (1998), dirigido por Walter Salles, oferece uma rica perspectiva para a discussão de conceitos bakhtinianos como dialogismo, polifonia e alteridade no contexto da formação de professores, especialmente no âmbito do Programa Nacional de Leitura e Escrita na Educação Infantil (LEEI). A obra cinematográfica e as experiências formativas do LEEI convergem para a construção de uma pedagogia humanizadora e dialógica, que valoriza a alteridade e a função ético-estética da linguagem na formação de vínculos pedagógicos significativos.
A pesquisa que embasa essa análise adota uma abordagem qualitativa-interpretativa, utilizando cenas do filme que envolvem a escrita de cartas e a relação entre Dora e Josué, bem como cartas autobiográficas de participantes do LEEI. Essa metodologia permite explorar como a transformação ética de Dora demonstra o poder da linguagem responsiva na constituição da subjetividade e da escuta pedagógica. A protagonista, inicialmente cínica e descompromissada com o envio das cartas que escrevia, exemplifica uma “antipedagogia” ao ignorar as vozes e necessidades alheias, demonstrando uma abordagem monológica. Contudo, a convivência com Josué a impulsiona a desenvolver empatia e responsabilidade, aprendendo a ouvir e a responder às necessidades do menino, o que reflete a ideia bakhtiniana de que o eu se constitui na relação com o outro.
A polifonia, que se manifesta nas múltiplas vozes presentes nas cartas do filme – carregadas dos dramas sociais e emocionais de indivíduos marginalizados – ressoa nos escritos dos professores em formação no LEEI, reforçando o papel da palavra como um espaço de memória, reconhecimento e encontro. Essa diversidade discursiva é fundamental para a educação ética, que fomenta o respeito por diferentes pontos de vista e o reconhecimento da perspectiva única do outro. A prática da escuta ativa e da responsividade, alinhada aos princípios do Círculo de Bakhtin, é destacada como essencial nas práticas educativas. A experiência do LEEI, através da escrita e leitura de cartas autobiográficas dos participantes, demonstrou o poder transformador da palavra de resposta, onde a formadora respondia individualmente a cada carta, consolidando um espaço de reconhecimento e humanização que transcendeu a formação técnica.
Em suma, a análise de “Central do Brasil” à luz do pensamento bakhtiniano e a experiência do LEEI sublinham a importância do diálogo, da alteridade e da polifonia para uma pedagogia que valoriza o encontro humano e a constituição ética da subjetividade. Essas abordagens convidam a uma reflexão contínua sobre a necessidade de escutar as diversas vozes ao nosso redor e de responder a elas com compromisso e responsabilidade, construindo uma educação que seja um exercício de presença e construção dialógica da existência.
Referência:
FAUSTINO, K. H. Palavra, encontro e alteridade: um olhar bakhtiniano sobre o filme Central do Brasil e a formação docente no LEEI. Open Minds International Journal, São Paulo, v. 6, n. 1, p. 91-96, jan./abr. 2025.
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