O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição do neurodesenvolvimento caracterizada por déficits na comunicação social e comportamentos restritos e repetitivos. A sua natureza altamente heterogênea manifesta-se em variabilidade clínica, habilidades cognitivas e linguísticas, e na presença de comorbidades como o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) e a ansiedade. Um estudo recente investigou a frequência e o impacto clínico da coocorrência de sintomas de TDAH e ansiedade em indivíduos com TEA. Os achados sugerem que essas comorbidades não só são comuns, mas também estão associadas a uma apresentação clínica mais complexa e a deficiências significativas no funcionamento adaptativo.
O estudo incluiu 260 participantes com diagnóstico de TEA e idade média de 7 anos e 5 meses. A frequência de sintomas de TDAH clinicamente elevados, conforme relatado pelos pais, foi de 62,7%, enquanto a de sintomas de ansiedade foi de 44,6%. Ambas as taxas foram significativamente mais altas do que as encontradas em amostras de populações não-clínicas. A coocorrência de ambos os transtornos também foi notável, com 53% dos participantes com sintomas de TDAH apresentando também sintomas de ansiedade, quase o dobro da frequência observada naqueles com TEA sem TDAH.
A presença dessas comorbidades influencia negativamente a apresentação clínica do TEA. Os participantes com TEA e sintomas de TDAH e/ou ansiedade apresentaram sintomas autistas mais severos em comparação com o grupo de TEA sem comorbidades, conforme os relatos dos pais. No entanto, essa diferença não foi observada nas avaliações profissionais, o que sugere um possível viés no relato dos pais, que podem perceber os sintomas do TEA como mais severos devido às dificuldades adicionais impostas pelo TDAH e pela ansiedade.
As comorbidades têm um impacto direto nas habilidades adaptativas, que são cruciais para o funcionamento diário, a socialização e a comunicação. A presença de sintomas de TDAH em crianças com TEA foi associada a maiores deficiências nas habilidades adaptativas de socialização. Além disso, o grupo com TEA, TDAH e ansiedade simultaneamente apresentou as maiores deficiências nas habilidades adaptativas de vida diária. Curiosamente, apenas a severidade dos sintomas de desatenção, e não a hiperatividade/impulsividade ou a ansiedade, foi um preditor significativo de um funcionamento adaptativo geral mais baixo, além de outros fatores como a idade e as habilidades cognitivas.
A pesquisa também identificou preditores específicos para cada comorbidade:
Desatenção: Ser do sexo feminino e ter pontuações mais baixas em habilidades adaptativas foram os maiores preditores de maior severidade da desatenção.
Hiperatividade/Impulsividade: Ser mais velho e ter habilidades cognitivas mais desenvolvidas e sintomas de comportamento repetitivo e restrito mais severos foram os maiores preditores de maior severidade de hiperatividade/impulsividade.
Ansiedade: Ser mais velho e ter deficiências sociais mais severas foram os maiores preditores de ansiedade.
Em conclusão, os achados enfatizam a importância do diagnóstico precoce de TDAH e ansiedade em crianças com TEA. A alta frequência de coocorrência e o impacto negativo dessas comorbidades no funcionamento adaptativo e na severidade percebida do TEA tornam imperativa a avaliação desses sintomas durante o processo de diagnóstico. A identificação e a intervenção precoces podem mitigar os efeitos negativos no desenvolvimento da criança, melhorando seu resultado a longo prazo.
Referência:
Avni, E., Ben-Itzchak, E. & Zachor, D. A. The Presence of Comorbid ADHD and Anxiety Symptoms in Autism Spectrum Disorder: Clinical Presentation and Predictors. Front. Psychiatry 9, 717 (2018).
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